sexta-feira, 29 de outubro de 2021
QUANDO VOCÊ QUISER VOLTAR
quinta-feira, 28 de outubro de 2021
A LEGIÃO ESTRANGEIRA (CLARICE LISPECTOR) - BREVE ANÁLISE
Antes de ir à análise do referido conto, gostaria de destacar que Clarice Lispector (1920 - 1977), nascida na Ucrânia, mas criada no Brasil, é minha escritora nacional favorita. E tenho muitos motivos para isso.
Primeiramente, porque ela é uma das autoras que mais tratam do universo feminino com verossimilhança. Clarice sabe o que é ser mulher, não apenas no sentido biológico, mas na alma. Quem tem a feminilidade propícia entende o que falo. Ser mulher não é fácil. Traduzir esse universo, então, é muito complexo. Nem santas, nem demônios, mas pecadoras. Clarice traduziu o universo feminino de forma brilhante, precisa, perfeita. E o que acho mais interessante em toda sua feminilidade e tradução do ser feminino é que Clarice morreu de uma doença exclusivamente feminina: de câncer no ovário. É uma das informações que creio que, enquanto eu tiver memória, eu vou lembrar.
Segundamente, porque, por meio de Clarice, eu conheci e me familiarizei melhor com a disciplina de Teoria Literária, especialmente, sobre tipos de narradores, que você pode encontrar muitos trabalhos acadêmicos analisando esse aspecto nas diversas obras da autora; mas, primordialmente, na questão do discurso indireto livre, que, até antes de estudar Clarice eu não conhecia, e que é um recurso que ela utilizou em todas as suas obras e que eu acho genial; uma forma de trazer o leitor para o âmago dos personagens. Se você quiser saber mais sobre isso, há muitos trabalhos acadêmicos sobre o assunto na internet também.
Em terceiro,- e não querendo me estender mais, - porque Clarice Lispector é a maior inspiração que tenho em escrever narrativas. Eu a considero uma escritora perfeita. Quem não? E, ainda que eu não atinja nunca sua perfeição, pois preciso aprender muito sobre tudo nessa vida, esse é o objetivo: narrar como Clarice.
Isto posto, vamos à breve análise de "A Legião Estrangeira", que você já deve ter lido.
O conto inicia
falando de um pintinho que a família ganhara e que não sabia o que fazer com ele. Narrado em primeira pessoa, a narradora fala que ela, o marido e os filhos ficaram observando o animal sem saber o que
fazer com ele, e compara o pinto aos sentimentos que “são água de um instante”.
Aborda, então, sobre como a bondade é despertada em cada uma das pessoas presentes no momento:
A meu
marido, a bondade deixa ríspido e severo, ao que já nos habituamos. Nos meninos
que são mais graves, a bondade é um ardor. A mim, a bondade me intimida. (p.97)
Esse episódio
faz com que a narradora-personagem se recorde de uma outra família que esteve
presente em sua vida e que, como ela afirma: “mal os conheci”. Mas esse “mal os conheci”, não significa que
ela não tenha tido contato com aquela família, já que logo ela diz: “Diante do
mesmo júri ao qual responderia: mal me conheço”.
Então, ela começa a narrar a história dessa família, em particular da filha do casal vizinho, chamada Ofélia. A família dá nome ao conto, pois, segundo a narradora, eram "trigueiros como hindus", de "olheiras arroxeadas" e "boca fina". Os pais, eram muito arrogantes e não permitiam qualquer tipo de aproximação. A filha, de oito anos, pelo contrário, passava horas na casa da narradora, falando o que ela devia ou não fazer, porque "essa, a boca 'fina, que assemelhava-se a um corte' falava".
Percebemos que
há uma antipatia entre a menina e a narradora; que na verdade elas se toleram:
a primeira, porque tinha muito a ensinar à outra, e a segunda porque era uma
forma de afrontar a mãe da menina.
Ofélia,
ela dava-me conselhos. Tinha opinião formada a respeito de tudo. Tudo o que eu
fazia era um pouco errado na sua opinião. Dizia, ‘na minha opinião’ em tom
ressentido, como se eu devesse ter lhe pedido conselhos e, já que não pedia, ela
dava. (p.103)
Ofélia era um
adulto “em forma de criança”.
Um dia, conta
a narradora, que trouxe um pinto da feira para os filhos, e que a menina veio
visitá-la e, ouvindo o barulho do animal, quis saber do que se tratava:
— É o
pinto.
— Pinto?
Disse desconfiadíssima.
— Comprei
um pinto, respondi resignada.
— Pinto!
Repetiu como se eu a tivesse insultado.
— Pinto. (p.106)
Esse episódio
é o que caracteriza na Teoria Literária a epifania,
que é um fenômeno na qual uma personagem, a partir de algum objeto, ou
pessoa, ou animal, passa a ver a vida de outra maneira, olhando para seu
interior.
A visão que
Ofélia e a narradora têm do pinto é uma epifania para as duas. No caso de
Ofélia, porque ela passa a agir como criança. E já não tem mais respostas para
tudo, ao contrário, está cheia de dúvidas. Primeiramente, sente inveja da outra
que possui aquele pinto: “olhou-me rápida, e era a inveja, você tem tudo, e a censura,
porque não somos a mesma e eu terei um pinto, e a cobiça – ela me queria para
ela” (p.106). Nesse trecho a narradora coloca sobre a menina todos os sinais da
imperfeição, inveja, cobiça, para mostrar à menina, que sabia muito mais de
muitas coisas que ela, que também não era Ofélia perfeita. Ofélia era uma criança que, na
verdade não sabia nada da vida, mas desejava descobrir.
No caso da
narradora, porque ela vê na menina como uma criança e enxerga a si própria como
a adulta, já que, até então, os papéis estiveram invertidos. Diante disso, Ofélia passa
a conversar com um certo recato, e a narradora a responder-lhe autoritária:
Com
alguma vergonha notei afinal que estava me vingando. A outra sofria, fingia, olhava
para o teto.
— Você
pode ir para a cozinha brincar com o pintinho.
— Eu...?
perguntou sonsa.
— Mas só
se você quiser.
Sei que
deveria ter mandado, para não expô-la à humilhação de querer tanto.(...) Mas
naquele momento não era por vingança que eu lhe dava o tormento da liberdade. É
que aquele passo, também aquele passo ela deveria dar sozinha. (p.108)
Então, notamos
aí, que a narradora é uma importante mediadora entre a menina e o pinto. O
pinto pode ser entendido como uma metáfora para vida. Nesse caso, a menina estaria indo ao encontro de uma vida que
ela não tinha, mas percebeu que a vizinha sim. Por isso, o desejo de ser a
outra. Ofélia com toda sua sabedoria herdada dos pais, não tinha vida própria, pois vivia, agia e pensava como adulto.
E aquela era a hora de voltar-se para si.
Assim, a menina
vai brincar com o pinto. Após algum tempo volta e vai embora. A narradora vai
até a cozinha e percebe que o animal está morto.
Encerra-se aí
o período da epifania para a menina.
Ofélia matou aquela nova vida que lhe foi oferecida e voltou para casa, local
onde se centrava, a fonte de sua sabedoria pronta.
A narradora
tentou alcançá-la inutilmente, gritando que “às vezes a gente mata por amor,
mas juro que um dia a gente esquece, juro! A gente não ama bem (...).” (p.110).
Percebemos, então, que a epifania continua tendo efeito na narradora que descobre
amar aquela criança, irritante em seus conselhos, em suas colocações inoportunas, mas a amava.
Assim, volta-se
para o início do conto onde há “o pinto de hoje”. É mostrado um movimento
cíclico: o pinto de ontem e o de hoje, a mesma água é outra, a vida se
renovando a cada instante.
Clarice é ou não genial?
Maíra Vanessa
REFERÊNCIA
LISPECTOR, Clarice. A Legião Estrangeira. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
quarta-feira, 27 de outubro de 2021
LOBA
Cercam-me
feito felinos
Mas finjo
que não os vejo
Eu finjo
que não os ouço
Não despertam em mim desejo
Protejo-me
prontamente de seus ataques
Heróis
ou vilões? Demônios ou santos?
Não os
quero conhecer tão cedo
Não provarei jamais seus encantos
Pois
dentro em mim habita uma loba
Não sou
morada de uma gata qualquer
Não escalo
muros, paredes, telhados
Não me
dou fácil para quem me quiser
Noturna,
meu canto é para a lua
Cultivo
intensamente a solidão
Finjo
que durmo, faço-me de morta
Fujo,
jamais imploro por perdão
Eles
não sabem lidar com minha liberdade
Eles
brigam entre si e disputam atenção
Mas quem
pode com a loba selvagem?
Quem
ousará domar seu coração?
Vago
solitária por caminhos conhecidos
Minha
companheira é a sabedoria e só
Rasgo
os inimigos aventureiros nas estradas
Jamais
terei deles piedade, pena, um mínimo dó.
Cercam-me
como perniciosos felinos
Deles
rio, troço, farto de gargalhar
Querer vencer uma loba selvagem?
Pago
para ver quem me domesticará!
Maíra Vanessa
terça-feira, 26 de outubro de 2021
Uma paixão recolhida, uma Carta e Oswaldo Montenegro no Programa do Jô
Encontrei a seguinte mensagem/carta/reflexão - que eu mandaria ou mandei para alguém - em meio aos meus escritos.
É interessante a gente revisitar nossa história e ler nossos sentimentos com olhar de expectador.
O texto é de 2011. São exatos 10 anos! E como eu mudei! E como tudo mudou!
No fim, fica uma pergunta: o que resta em mim da garota de 10 anos atrás?
O que resta em você do que você foi um dia? Revisite suas histórias!
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DE 2011
Antes de ontem eu fui à missa e na comunhão cantaram a música que você sempre pede para cantarmos: A Barca.
Ontem, tive uma surpresa ao ver você tocando na missa, não porque você estava tocando, mas porque cada nota, cada acorde que você tocava, tocavam minha alma como eu nunca havia sido tocada.
E hoje, durante a madrugada, eu lutava comigo mesma para dormir e não conseguia. Então, ao invés de ir para o PC, liguei a TV (1:26) e estava passando o Programa do Jô. E quem estava sendo entrevistado? Oswaldo Montenegro, que você tanto ama. E ele cantou, magnificamente, uma música que eu nunca havia escutado: A Lista.
E o que me chamou mais a atenção foi o seguinte verso: “Quantos amigos você jogou fora?”
Eu havia tomado a decisão de me afastar de você, por muitos motivos, mas, principalmente, por sábado. É difícil fazer isso quando a gente é bem próxima de uma pessoa e conhece gostos e desgostos, porque, querendo ou não, uma música, uma cena ou uma circunstância nos faz lembrar da pessoa.
E foi isso o que aconteceu nos últimos dias: uma porção de coincidências imbecis, mas que me fizeram ver que um dia não pode mudar uma história.
Bem... O que quero dizer é que você pode não se importar, e eu sei que para você tanto faz, mas eu me importo.
E posso ser imatura, impulsiva e algumas vezes até mal educada, fazendo coisas ou dizendo coisas e não medindo as consequências... Infelizmente, eu não sou perfeita e não sei fingir que estou bem quando não estou, eu não sei ignorar grosserias (e você foi até um pouco estúpido comigo) e eu não sei levar desaforo para casa.
Mas, eu sei reconhecer quando erro. Talvez esse tanto de palavras não façam sentido para você... não signifiquem nada. Eu sei que isso tudo não significa nada para você. Mas, significa para mim. Talvez você me ache uma boba. Pode me achar. Eu estou me sentindo assim. Mas, eu vivo num mundo paralelo onde poucas pessoas conseguem me encontrar.
Tem momentos que eu acho que você está me encontrando, afinal, “somos tão iguais”. Mas, de algum modo, parece que você anda vendo apenas o pior em mim. “A culpa é toda sua e nunca foi”. Se nada fizer sentido, tudo bem. O importante aqui é que quero dizer que, mesmo você não se importando, eu me importo com você. E, por enquanto, isso basta!
Maira Vanessa
segunda-feira, 25 de outubro de 2021
TRILHAS: 5 MÚSICAS FAVORITAS DE NOVELAS (ANOS 1970 e 1980)
Olá, leitores!
Você viu essas novelas? O que achou das trilhas? Temos alguma favorita em comum? Deixe seu comentário.
domingo, 24 de outubro de 2021
A INÊS - LORD BYRON
Hoje, compartilho um poema de Lord Byron (1788-1824), poeta gótico inglês que foi inspiração para sua geração, bem como para um dos meus prediletos, Álvares de Azevedo.
Aqui um dos poemas que mais gosto, cujos últimos versos, tão impactantes, falam muito sobre o amor e sobre a vida.
A Inês
sexta-feira, 22 de outubro de 2021
quinta-feira, 21 de outubro de 2021
MENINA
quarta-feira, 20 de outubro de 2021
ALGUÉM
"Se quando um certo alguém
Desperta o sentimento
É melhor não resistir
Hoje acordei pensando em como queria estar com alguém. Não o
alguém etéreo, o alguém ideia, o alguém platônico, mas o alguém real, tangível,
palpável.
Eu gosto tanto de estar sozinha! Sempre gostei da minha
companhia, de ouvir as músicas que gosto sem ter que pular a favorita porque
alguém não gosta; de ver meus filmes preferidos, sem ter que escolher outros, porque os romances não são os preferidos de alguém; de ver minhas novelas
favoritas, sem ter que escolher outro programa, só porque alguém não gosta de
novelas; de ler meus livros quando quero, porque quando se está com alguém
parece impossível passar para a página seguinte.
Eu gosto tanto de estar sozinha! De sair com minhas amigas,
ou amigos, quando me é conveniente. De flertar com os caras que me são
atraentes. De beijar os que valem a pena. De dizer sim quando quero e não
quando me convém, não por lealdade, não por fidelidade, mas por vontade.
Eu gosto tanto de estar sozinha! De me planejar sozinha, de me sentir sozinha, de me ver sozinha. De ver um futuro só meu, que quem decide sou apenas eu, quem tem o controle e organiza e manda sou eu, simplesmente, sem ter que pedir a opinião de ninguém.
Eu gosto tanto de estar sozinha! De gastar meu dinheiro como quero, sem ouvir bobagens
de alguém: “Dior? Não tem creme mais barato? Outra roupa? As suas estão novas! Mais
sapato? Os que têm não são o bastante? Pra que tantos óculos de sol?” “O
dinheiro é meu. Gasto como quiser!”
Eu gosto tanto de estar sozinha...
Mas, quando o alguém é real, quebra nossas pernas. Minha própria companhia já não é o suficiente. Minhas músicas e filmes e novelas e livros... Será que são tão importantes? Minhas amigas, ou amigos, marcam de sair, mas...
tenho algo (alguém) mais importante! Flertes, ficar, caras? Do que você está falando?
Sou fiel por escolha! E passo a planejar, me organizar, a controlar a vida a
partir de uma nova perspectiva, de uma nova opinião. Meu dinheiro? Continua
sendo meu! Gasto para ficar mais bonita para alguém!
Hoje acordei pensando em como queria estar com alguém: aquele alguém real, tangível, palpável, que tem nome, endereço e smartphone.
terça-feira, 19 de outubro de 2021
ENDYMION - JOHN KEATS
John Keats (1795 - 1821), um dos expoentes do Romantismo inglês, trata, em suas poesias, temas como a natureza e a beleza. O trecho que escolhi apresentar hoje fala sobre ambos.
Extraído do poema Endymion, a parte destacada aborda sobre os percalços da vida, que são inevitáveis; contudo, o que é belo é suficiente para suavizar tais agruras, alimentar a alma e encher o coração. Essas belezas, referenciadas pelo poeta, encontram-se no que há de mais simples, acessível a todos e sem cobrar nada: na natureza.
Como menciona Keats, o que é belo é perene, tal qual este poema:
O que é belo há de ser eternamente
Uma alegria, e há de seguir presente.
Não morre; onde quer que a vida
breve
Nos leve, há de nos dar um sono
leve,
Cheio de sonhos e de calmo alento.
Assim, cabe tecer cada momento
Nessa grinalda que nos entretece
À terra, apesar da pouca messe
De nobres naturezas, das agruras,
Das nossas tristes aflições
escuras,
Das duras dores. Sim, ainda que
rara,
Alguma forma de beleza aclara
As névoas da alma. O sol e a lua
estão
Luzindo e há sempre uma árvore
onde vão
Sombrear-se as ovelhas; cravos,
cachos
De uvas num mundo verde; riachos
Que refrescam, e o bálsamo da
aragem
Que ameniza o calor; musgo,
folhagem,
Campos, aromas, flores, grãos,
sementes,
E a grandeza do fim que aos
imponentes
Mortos pensamos recobrir de
glória,
E os contos encantados na memória:
Fonte sem fim dessa imortal bebida
Que vem do céus e alenta a nossa
vida.